Ela conduziu uma pesquisa com 5.000 homens e mulheres na faixa etária dos 18 aos 96 anos e reuniu artigos de renomados especialistas na coletânea “Corpo, Envelhecimento e Felicidade”, na qual investiga de que maneira homens e mulheres vivenciam, percebem e elaboram as mudanças corporais, culturais, sociais e psicológicas oriundas da passagem do tempo. Com esse rico material em mãos, a antropóloga Mirian Goldenberg, 61 anos, descobriu que a curva da felicidade retorna com força total aos 60 anos para as mulheres, quando elas dizem viver o melhor momento de suas vidas. E qual o segredo? Elas descobrem que “a melhor rima para felicidade é liberdade” e aprendem a trazer mais leveza para a vida. Confira os principais trechos de sua entrevista para o portal do Instituto de Longevidade Mongeral Aegon.

Por que as mulheres entre 40 e 50 anos são as que mais se sentem infelizes e frustradas? Do que elas reclamam?

Mirian Goldenberg – Na pesquisa, elas reclamam que falta tudo. Quando elas não têm um companheiro, reclamam da falta de um. Quanto elas têm um companheiro, reclamam de falta de romance, cumplicidade, atenção, carinho, beijo na boca. Muitas dizem ainda que falta tudo! É um momento de extrema insatisfação, porque elas tentam conciliar inúmeros papeis que são, na maior parte das vezes, inconciliáveis. É o fundo do poço, porque elas querem rir mais, ser mais leves – e não conseguem.

E quando a felicidade faz a curva?

Mirian Goldenberg – Percebo que, depois dos 50 anos, essa curva começa a subir. E, quando as mulheres fazem 60 anos, elas dizem, categoricamente: “É o melhor momento de toda a minha vida”; “Nunca fui tão feliz”; “É a primeira vez que eu me sinto livre e posso ser eu mesma”.

 “A busca da felicidade é também uma tentativa de equilibrar a liberdade que nós conquistamos com a segurança que nós precisamos”

Por quê?                                       

Mirian Goldenberg Elas valorizam duas coisas, principalmente: a liberdade de não se preocupar com a opinião dos outros e de viver a própria vida, a partir da própria vontade; e o tempo, porque dizem que, após cuidar a vida inteira de todo mundo, agora é hora de cuidar delas mesmas, em primeiro lugar. Então essa mudança de foco e essa valorização do tempo para ela mesma é uma grande revolução.

Pode-se dizer, então, que liberdade é sinônimo de felicidade?

Mirian Goldenberg – A [escritora] Simone de Beauvoir [1908-1986], num livro que eu acabei de escrever o prefácio, “A Força da Idade”, mostra exatamente isso, que a melhor rima para felicidade é liberdade. E nós não precisamos abrir mão da felicidade para sermos livres. E nem também abrir mão de uma certa segurança. É uma combinação: para ser feliz, nós precisamos de uma dose de liberdade, porque liberdade sem segurança é caos, e precisamos de segurança, porque segurança sem liberdade é prisão. A busca da felicidade é também uma tentativa de equilibrar a liberdade que nós conquistamos com a segurança que nós precisamos.

“Construir uma bela velhice é, na verdade, viver plenamente todas as fases da vida”

Existe uma receita de felicidade para as pessoas com mais de 60 anos de idade?

Mirian Goldenberg – O que eu aprendi pesquisando esses 5.000 homens e mulheres, nesses mais de 30 anos, é que a velhice não é uma ruptura, é uma continuidade com a própria vida. As pessoas que têm projeto de vida, amizades, certa segurança afetiva, emocional e financeira, além de boa saúde, elas podem ser felizes em todas as faixas etárias da vida.

Eu tenho pesquisados de mais de 90 anos que dizem viver o melhor momento da vida: “Estou vivo, sou feliz, tenho amigos, curto os momentos com a minha família”, justificam. Então, não há, como as pessoas imaginam, uma ruptura ao fazer 60, 70, 80, 90 anos. Construir uma bela velhice é, na verdade, viver plenamente todas as fases da vida.


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Mas existe uma diferença interessante entre homens e mulheres quando envelhecem, quando eu pergunto “Quem vai cuidar de você na velhice?”. Elas dizem: “Eu mesma ou minhas amigas”, e mostram que valorizam muito a liberdade, a independência econômica e a amizade. Já eles dizem: “Minha esposa, minhas filhas ou minhas netas”, e valorizam mais a vida familiar e afetiva.

Não é à toa que os homens mais velhos, quando ficam viúvos ou se separam, se casam mais do que as mulheres. Isso mostra que eles não cultivam durante a vida os amigos e querem, sim, alguém para compartilhar a vida em todas as fases e, principalmente, na velhice.

“Os homens dizem que não invejam nada nas mulheres; pouquíssimos, a maternidade”

Na sua avaliação, homens experimentam níveis mais elevados de felicidade do que as mulheres? 

Mirian Goldenberg – Acho impossível medir o nível de felicidade. Não dá para dizer que os homens ou as mulheres são mais felizes. Mas, a partir do discurso deles e do delas, eu posso dizer, sim, que as mulheres, quando envelhecem, valorizam mais a liberdade e a amizade, e isso para elas é sinônimo de felicidade. Os homens valorizam muito mais a vida familiar e afetiva, e isso para eles é sinônimo de felicidade.

Para ambos, ter projetos de vida também é fundamental para a felicidade. Só que os homens querem projetos de vida que envolvem trabalho ou estudos, e as mulheres se voltam mais a se livrar dessas obrigações sociais ou profissionais e priorizam o lazer para curtir a liberdade conquistada tardiamente.

O que os homens têm a ensinar às mulheres sobre felicidade? E elas a eles? O que mais desperta inveja um do outro?

Mirian Goldenberg – As mais jovens dizem, categoricamente, que invejam a liberdade masculina: com o corpo, sexual, de rir e brincar de qualquer bobagem. E enxergam ela como algo difícil de conquistar. Os homens dizem que não invejam nada. Pouquíssimos dizem que invejam a maternidade. Isso mostra também as diferentes posições de homens e mulheres na nossa cultura.

Culpabilizar a mulher pela própria infelicidade não seria uma visão simplista, se levarmos em conta que essa mulher hoje com mais de 40 anos de idade passou a vida inteira entupida de estereótipos?

Mirian Goldenberg – Eu não vejo a mulher se culpabilizando pela própria infelicidade. Na verdade, é a cultura brasileira que aprisiona as mulheres em determinados modelos – de corpo, de família –, que até os 50, 60 anos, provoca muita infelicidade. Em todas as minhas pesquisas, eu procuro mostrar que é a nossa cultura que produz uma infelicidade, principalmente nas mulheres mais jovens. E isso é fácil ver pelo número das que tomam antidepressivos, ansiolíticos, remédios para dormir. Somos campeões mundiais em consumo desses medicamentos. O que eu quero é que as mulheres compreendam as pressões e as prisões sociais que fazem com que nós sejamos bastante infelizes em uma fase da vida.

AS LIÇÕES DAS MULHERES QUE PASSARAM DOS 60 ANOS 

  • O tempo é o verdadeiro capital: aprenda a dizer não
  • Faça uma faxina existencial: tire da sua vida as pessoas que só te fazem mal
  • Ligue o botão do “foda-se interno”: não dê importância à opinião dos outros
  • Valorize as amizades: as amigas são suas companheiras hoje e no futuro
  • Aprenda a rir mais, inclusive de você mesma

Fonte: TED “A Invenção de uma Bela Velhice”, com Mirian Goldenberg

QUER SABER MAIS? Assista ao TED de Mirian Goldenberg:

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